quarta-feira, 14 de junho de 2017

Através da música, rapper leva educação e empoderamento para o bairro de Pernambués

Tainane Oliveira

Aos 29 anos, Negro Davi é responsável por diversos movimentos sociais e culturais no bairro mais negro de Salvador


Reprodução Facebook

O Hip-Hop surgiu como uma forma da juventude negra expressar as suas dificuldades e os distúrbios sociais causados pela herança histórica do racismo. Através do rap o jovem dá voz aos problemas da sua comunidade e desperta a inquietação das autoridades. Em uma sociedade em que a qualidade de vida e o incentivo para as pessoas que moram nas periferias são mais que precários, o Hip-Hop também é uma forma de fugir da criminalidade. Um dos exemplos que o Hip-Hop pode mudar vidas é o rapper, sindicalista e comunicador, Negro Davi. Apresentador do programa de Rádio ‘’Hip-Hop Vai Além’’, e um dos organizadores do concurso Beleza Negra, Negro Davi é envolvido com questões sociais no bairro onde mora, Pernambués, que é considerado pelo IBGE como o bairro mais negro de Salvador. Aos 29 anos, o rapper conta como o Hip-Hop mudou a sua vida e fala um pouco sobre os seus projetos voltados para o incentivo da juventude negra. 

Repórter: Você como um jovem que nasceu em bairro periférico e se formou em escola pública, viveu toda a realidade de dificuldades e carências tanto na qualidade de vida quanto no ensino, como o Hip-Hop influenciou à sua vida?

Negro Davi: O Hip-hop  foi um escudo para ensinar a  lutar contra o racismo e me ajudou na minha escolha de como se posicionar na sociedade. Descobri a beleza do meu cabelo crespo e que Deus fez as nações cada um de seu jeito. Influenciou na minha maneira de vestir, falar, respeitar e buscar soluções para conflitos. Sigo o hip-hop como um instrumento de educação.

Repórter: Como o hip hop pode influenciar na formação de jovens periféricos? 

Negro Davi: Eu sou um exemplo disso, eu comecei a cantar rap e entrei de cabeça no Hip-Hop. Entrei na rádio e comecei a participar de espaços do movimento social e de classes trabalhadoras. Minha vida mudou, passei a ler e desenvolver algumas habilidades e enxergar a vida de uma forma ampla. Aprendi a dialogar com pessoas de diversas camadas sociais e percebi que eu tinha que ser um jovem informado  e que merecia ser tratado como ser humano como manda a constituição federal.

Repórter: Você acredita que conhecer essa cultura ajuda a afastar os jovens negros das armadilhas que a sociedade impõe para eles? 

Negro Davi: Claro que sim, acredito e conheço  vários jovens e artistas renomados no Brasil que faz uso  dessa cultura como escudo para superar dificuldades, citando o rapper Dexter de São Paulo.

Repórter: O que você acha que falta hoje nas escolas para incentivar esses jovens?

Negro Davi: Na escola falta atividades dinâmicas que envolvam os jovens, como música de qualidade que contribui na formação do intelecto do indivíduo, debate concentrado sobre a África, planejamento familiar, leitura da constituição federal, inclusão e aproveitamento de  estudantes para o mercado de trabalho, ensaio amplo sobre o papel da escola e a família. Além de um direcionamento e analise sobre a realidade vivida  do jovem para saber porque ele está tendo determinado comportamento.

Repórter: Me fala um pouco sobre os seus projetos no bairro de Pernambués.

Negro Davi: Comecei em Pernambués fazendo atividades culturais com o intuito de inclusão ao Hip-Hop. Ajudei na construção de eventos solidários na comunidade e a fundar uma ONG que hoje não se encontra mais no bairro. Faço um programa de rádio chamado ‘’Hip-Hop Vai Além’’, que é conhecido internacionalmente, e foi destaque em jornais da capital. Fui coordenador por um período do curso de informática do Gap, ministrei aulas de Hip-Hop e cidadania no Colégio Estadual Ministro Aliomar Baleeiro, sou um dos realizadores do concurso Beleza Negra Pernambués e ajudei a trazer Serginho do  Adão negro e Eduardo Tadeu para conversar com jovens da comunidade. Ajudei também na organização de dois eventos que trouxeram o rapper Dexter para a comunidade.

Repórter: Teve apoio em algum deles? 

Negro Davi: Primeiramente de Deus que sustenta minha caminhada, da família e amigos que se identificam com a causa. Tive sim apoio direto e indiretamente do Sindilimp (BA), mas isso não significa que resolveu todos problemas a luta ainda é dura.

Repórter: Como funciona a rádio? O que geralmente você apresenta lá?

Negro Davi: Eu comecei fazendo um projeto na Pernambués FM, fui para outra rádio que fechou e agora estou na WD com o Hip-Hop Vai Além. O programa vai ar aos sábados às 14h. Nesse programa eu sempre entrevisto personalidades do Hip-Hop nacional e pessoas que tenham a ver com o movimento e que debatam o tema ''jovem''. Nos fomos visitados por um grupo de Atlanta, dos Estados Unidos, e conseguimos ser uma referência nacional para promover o Hip-Hop e que tem caráter comunitário. Estamos sempre debatendo e trazendo pessoas para contribuir com a comunidade. 

Repórter: Como um dos organizadores do Beleza Negra, me diz de que forma um evento assim muda a dinâmica da comunidade? Principalmente porque ele fala de identificação, como ele consegue atingir isso na juventude de Pernambués?

Negro Davi: Tem a questão do empoderamento negro, do cabelo crespo, do turbante como empoderamento e como simbolo de apropriação cultura. É uma forma das pessoas saberem que independente de você se assumir ou não, você pode trazer essas questões para a comunidade. Fortalecer e levar para as pessoas esse discurso, essa idéia, ainda mais para as crianças que não veem os negros bem representados na televisão.

Repórter: Mesmo dentro do seu bairro, você já sofreu preconceito? 

Negro Davi: Sim, por conta do meu cabelo. Eu sou nascido e criado em Pernambués. Já sofri bullying na minha rua quando alisava meu cabelo. Depois, graças a Deus, eu conheci a cultura negra, passei a me assumir. Hoje as pessoas que riam e me criticavam passaram a usar o cabelo crespo também

Repórter: Quais são os seus projetos recentes e o que planeja para o futuro em relação ao Hip-Hop? Pensa em algo relacionado ao incentivo dos jovens periféricos?


Negro Davi: Estou buscando qualificação para levar informação para a juventude. Participei esse ano do comitê  internacional de juventude trabalhadora, estou gravando meu novo cd que vem pautando muito o tema da juventude, gravei uma canção chamada Uma Viagem a Moçambique com participação de uma africana. Também lancei meu site www.negrodavi.com, estou desenvolvendo uma marca de roupas voltada para meus trabalhos e ainda vem mais novidades por ai.

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